Vivendo na cidade morta

 

 


Mario Monicelli *
l’Unità

20 de julho de 2002

Tradução Imediata

Cheguei em Gênova anteontem. E, por enquanto, vi só uma cidade morta. Pelas ruas não havia ninguém, tudo estava deserto, as lojas fechadas. Nada estava "em brasas", pelo contrário, diria que estava tudo muito apagado. Assim, começamos a trabalhar. E, com a minha trupe, escolhi seguir o mundo católico, porque era aquele que me interessava mais. Queria saber que posição ele tomaria frente ao G8 e, efetivamente, trata-se de um universo extraordinariamente interessante. Em seu interior, há gente combativa, todos missionários vindos de longe, ou que irão para longe. Eles provêm de países vítimas da miséria e da degradação. E aquilo que impressiona é que não estão aqui para jogar papo fora e voltar para suas paróquias ou embaixadas.

Hoje, por exemplo, fomos com a trupe de irmã Patrícia, uma missionária que veio para Gênova para manifestar contra o G8. Ela, como tantos outros missionários, não é contra a globalização, que em si e por si mesma é uma coisa positiva… Mas contra as potências mundiais que a gerem de uma maneira desastrosa. Pois bem, o empenho desses missionários é lutar por um mundo melhor e rezar. Mas sobretudo lutar para cancelar a dívida do Terceiro mundo. Aliás, não só a dívida, como também os juros. Cobrar juros dos países pobres, na realidade, é um truque usado pelos poderosos da terra para manter na pobreza aqueles desesperados, assim como para sacar dinheiro.

Seguindo esse percurso, à tarde fomos ver Don Gallo, um outro sacerdote muito empenhado no social, um verdadeiro guerreiro cujas opiniões sobre certos temas é de grande interesse. Mais tarde, hoje à noite, acompanharemos uma cerimônia verdadeiramente religiosa. Será transportado para a igreja um quadro pintado em papel por campesinos chilenos que quiseram presentear, para a ocasião, uma comunidade lígure. Haverá uma longa procissão com músicas, participação de várias pessoas, e se falará mais uma vez do cancelamento da dívida dos países do Terceiro mundo e das lutas a favor dos pobres. Para acompanhar essa cerimônia, pedi o apoio de uma outra trupe. Aqui em Gênova, fomos muitos a chegar. Hoje encontrei Daniele Segre, Ettore Scola, Gillo Pontecorvo, Cristina Comencini, Franco Giraldi. E sei também que há tantos outros jovens colegas pela cidade.

Naturalmente, a coordenação com os outros diretores de cinema funciona de um modo um pouco precário, através desses aparelhos infernais que são os celulares… Porém o que importa é a emoção e o entusiasmo com os quais se fazem certas coisas. Sim, ainda hoje… finalmente hoje… Disseram que a história tinha terminado com a queda do muro de Berlim. Em vez disso, finalmente, a história recomeça. Existe a sensação de que algo está recomeçando, algo que parecia morto, apagado… Justamente Panebianco, o ‘opinionista’ preferido pela mídia, alguns dias atrás nos atacou, dizendo: "olha aí eles de novo…" ele nos definiu como "olha-aí-eles-de-novo"… aqueles que encheram o nosso saco por cinquenta anos, o cinema de esquerda, militante, etc. etc.

"Aqueles" levantaram a cabeça de novo, e reapareceram por culpa ou por mérito desse G8. Bem, a resposta que dou a Panebianco é que os "olha-aí-eles-de-novo", felizmente estão aí de novo, a história recomeça e não morreu… como ele e tantos outros estavam tanto esperando.

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*Mario Monicelli é cineasta, dirigiu " Parenti serpent"i (1992) "Romanzo popolare" (1974)", "L'Armata Brancaleone" (1966), dentre outros filmes

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